Enigma de Daniela, O

Oliveira Benoit, Lelita
ILUMINURAS

98,00

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  A retirada de um tumor do cérebro de uma mulher se embaraça, nesta narrativa, como criminoso desastre de automóvel sofrido por outra: “águas me cercaram até a alma, o abismo me rodeou, e as algas se enrolaram na minha cabeça”. É como se, pelos hábeis dedos do neurocirurgião (que alinhavam o fio de acaso entre ambas), suas histórias se enredassem, se enovelassem, a ponto de compor este “romance de vidas”, essas 36 “Linhas” que as costuram.  Enquanto a segunda mulher (vítima de lesão m edular) perde a mobilidade, a outra (recuperada, com a potência do seu sopro vital) lhe cede à voz, e, com ambas as mãos, juntas, constroem a muralha da sua resistência e do seu alerta ao mundo.Mas não suponha o leitor que este é um livro de autoajud a. Ao contrário, trata-se de um volume que pede ajuda!   E é de tudo que o romance se compõe: de pedras, pedacinhos, retalhos, atalhos, desenhos de todos os tipos – pedregulhos. É um Muro de Lamentações onde, em cada interstício entre as palavra s, um a um dos componentes desse enredado acontecimento enfia (esconde?) o seu minúsculo papel, a sua mensagem, o seu recado, o seu pedido, a sua prece: o seu enigma. Todos interligados (amarrados entre si como num “cipó de floresta amazônica”) no me smo Shoah.   Daí o hibridismo desta obra, composta por toda a sorte de contribuições ficcionais, que pedem auxílio e apelam para que sejam preenchidas com o que o leitor puder lhes achegar com o cimento da sua experiência. São narrativas de lendas, de cenas dolorosas; diálogos internalizados, matéria jornalística, relatórios; improvisações jazzísticas, poemas; entrevistas, suposições, depoimentos; notas ao pé da página, filosofia, história, crítica social, psicanálise, literatura; reli gião. Misticismo em todos os sentidos.  E o mérito que ela vai ganhando não é só porque nos põe direto em contato com a inaudita e inimaginável dimensão do que cabe aos tetraplégicos, daquilo que lhes antecipou a tragédia ou que lhes sobreveio a tal infortúnio – e isso não é possível medir em éfas. É que, por meio da magia de tal miscigenação literária, do envolvimento íntimo com o leitor, a escrita de Lelita Benoit expõe uma evidência de difícil deglutição. Que nada ou ninguém neste n osso território – muito menos alguma instituição (seja a Medicina, a Educação, os Seguros Sociais, a Justiça, o Trabalho – e, sobretudo, a consciência discriminadora das pessoas) está minimamente preparado para oferecer cidadania a alguém tocado por