Vapor barato

Alves-Bezerra, Wilson
ILUMINURAS

62,00

Estoque: 8

   É possível adoecer de um país? Durante as sessões de psicanálise que formam os capítulos deste livro incisivo, os dramas íntimos cedem lugar no divã a desilusões políticas dolorosas. As disfunções da vida pública viram aqui um problema p essoal dos mais agudos, a ponto de ameaçarem a saúde mental do angustiado e queixoso analisando criado por Wilson Alves-Bezerra. Motivos de reclamação não faltam, e é possível que muitos sejam compartilhados pelos leitores deste livro. Ficção à manei ra de um desabafo, flertando às vezes com a imprecação, Vapor barato remói com amargor assumido os acontecimentos da história recente do Brasil. Em sua prosa encrespada, transtornada com o país que chama ironicamente de “Esmerilhândia”, o protagonist a do livro oscila entre abatimento e fúria, melancolia e surto. Mesmo naqueles momentos em que seu personagem extravasa sua raiva de modo mais direto, porém, Alves-Bezerra não oferece ao leitor qualquer tipo de catarse. Quanto mais desfia sua contrar iedade, mais a fala ácida que se desdobra aqui parece girar em falso.    O leitor vira as páginas, mas tem a sensação de ser lançado a cada vez de volta ao mesmo lugar. Nessa prosa que se volta de modo insistente e aflitivo sobre si mesma, o autor sugere uma figuração possível para um país condenado à repetição sintomática. É sobretudo esse sintoma de dimensões continentais que não para de se repetir aqui, produzindo a certa altura um efeito insólito de desorientação temporal. Nem semp re é fácil dizer se aquilo que se lê diz respeito ao passado recente, àquilo que vai acontecendo naquele mesmo instante ou à imaginação de um futuro distópico. A indistinção entre fantasia e realidade deixa então de ser um problema interno à história que acompanhamos para tocar de modo perturbador nossa própria leitura. Miguel Conde